segunda-feira, 3 de agosto de 2009
A Casa
Desde que me conheço por gente a casa de vovó está caindo. Construção temperamental, ela nunca quer ser consertada. Você arruma uma janela, ela bambeia o telhado e inunda o piso, você remenda o telhado e o piso apodrece. A primeira parte da casa a quebrar foi meu avô. Quebrou que não tinha mais jeito, não tinha outro que encaixasse, a casa ficou sem avô. Depois o cachorro espanou. Normal, estava passado demais. Vovó tampouco quis outro, essas coisas de velho: “não se faz mais Banzés como antigamente”. Daí em diante, a coisa só descambou. A geladeira caiu a mais de 30 anos e até hoje manca da perna esquerda. Mas não estragou como o papagaio. Esse sim não fala mais nada e não há peça de reposição que dê jeito. Modelo antigo, não se vende mais, dizem até que é proibido. O rádio e meu tio, assim como o papagaio, já não cantam. Ambos pifaram e, vez ou outra, soltam alguns chiados inaudíveis. Como eu disse, coisa de construção antiga. O encanamento já era e o orgulho também. Sem encanamento e sem orgulho próprio, todos tomam banho de caneca, ali mesmo no quintal de cimento quebrado, em uma bacia de metal torto. A casa não acha ruim. Era bem isso que ela queria, invocada, jogando rebocos na cabeça dos outros como se não houvesse problema. O fato é que ela não gosta de muita gente, então quase ninguém faz questão de entrar mais ali. Tudo cheira a velhos erros e a vida mofada. Para a vida da minha avó já não há remédio, foi corroída pelas beiradas, deixada em ruínas e largada lá para os anos subirem na carcaça. Mas, apesar de tudo, a casa resiste, esperando que o tempo acabe com do único pilar que a mantém em pé. Afinal, é inevitável: não importa o quanto demore, um dia a casa cai.
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2 comentários:
Filha da puta, me fez chorar...
Rosa, posicione-se sobre a nova lei do governador de SP? Estou postando textos de vários autores no meu blog e quero um seu...
:)
bj
Rê
www.emaisessa.blogspot.com
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